Enquanto o coronavírus vai matando e contaminando equipe de saúde, das janelas do mundo, a população os aplaudem.
Por Gonçalo Junior e Priscila Mengue – Editado p/Cimberley Cáspio

Com 17 mortos e mais de 3 mil profissionais da saúde contaminados na Itália até agora, na linha de frente no combate ao novo coronavírus, médicos e enfermeiros confessam medo, insegurança e apreensão com o avanço da doença. Eles não temem não apenas o próprio contágio, mas também a transmissão para a família — o que faz mudar até a rotina dentro de casa. Além disso, os profissionais da saúde se queixam de falta de materiais, como luvas, máscaras e álcool gel, em algumas unidades hospitalares.
Os índices de contaminação entre os profissionais de saúde é alto. A Federação das Ordens dos Médicos Cirurgiões e Dentistas da Itália, país com maior número de casos na Europa, criou um site em homenagem aos “mortos em combate”. No Brasil, foram registrados 2 óbitos de profissionais de saúde.
O cirurgião da coluna Luiz Cláudio Rodrigues, do Hospital Santa Marcelina, também usa a metáfora da guerra. “Estamos em uma guerra e fomos convocados. Não temos opção de dizer ‘não’. A informação que a população recebe é a mesma que temos”, conta.
Quando é possível, os próprios médicos adotam para si uma espécie de quarentena. Aos 71 anos, o oncologista Artur Malzyner, consultor científico da Clínica de Oncologia Médica (Clinonco) e médico do Hospital Albert Einstein, afirma passar 90% do tempo em casa. “Temo a contaminação sim. Os médicos que acabaram falecendo não são poucos. Mudei radicalmente minha rotina. Só vou ao consultório quando é essencial. Parei de praticar esportes e estou comendo em casa”, diz o especialista.
A preocupação também se estende a enfermeiros. “Nosso ambiente de trabalho está tenso, pois estamos tendo conflitos. Os médicos estão assustados e cobram mais de nós”, diz uma enfermeira que atua em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) na zona leste de São Paulo. “O que mudou na nossa rotina foi trabalhar com medo. O medo de se contaminar ou contaminar nossos familiares.”
Ao menos seis denúncias de falta proteção adequada para profissionais de saúde durante a pandemia do coronavírus foram registradas nesta semana no Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp). Os casos envolvem principalmente a falta de EPIs, como máscara facial, óculos, gorro, avental e luvas, em instituições tanto da rede pública quanto da privada, mas são negadas pelas instituições.
No caso da rede privada, as denúncias envolvem os Hospital Sírio Libanês e São Camilo, ambos na capital, que não estariam disponibilizando EPIs suficientes. Além disso, no caso do primeiro, um profissional ainda se queixou que médicos estão sendo “jogados na linha de frente sem o necessário suporte”. As duas instituições negam o conteúdo das denúncias e dizem ter insumos e equipamentos suficientes. A Prefeitura de São Paulo não respondeu às queixas.
O sindicato cogita procurar o Ministério Público e até entrar com ações na Justiça. “A gente vê que a rede de saúde já tinha uma série de problemas antes. Com o coronavírus, era de se esperar que esses problemas da rede, de falta de insumos e medicamentos, ficariam mais graves.”, diz Eder Gatti, presidente do Simesp. Na terça-feira, 17, o Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo divulgou comunicado em que diz estar “temeroso” sobre o fornecimento de EPIs adequados e pede o afastamento de profissionais em grupos de risco.
Aplauso coletivo
Na noite desta quinta-feira, 19, brasileiros foram às suas janelas para aplaudir os profissionais da área de saúde pelo seu trabalho na linha de frente da luta contra a covid-19. O movimento foi convocado por internautas nas redes sociais e também por meio de mensagens no aplicativo Whatsapp usando a hashtag #aplausosnajanela.
Algumas cidades já realizaram o ato e uma nova convocação havia sido feita para esta sexta-feira. O texto de convocação diz que “enquanto estamos protegidos em casa, os profissionais da saúde estão enfrentando essa crise onde muitos estão se contaminando”. As características do ato são as mesmas: abrir as janelas de casa, varandas e portas, para um longo aplauso aos médicos, enfermeiras e outros profissionais de saúde que combatem a doença. “O povo brasileiro bate palmas para os trabalhadores e trabalhadoras da saúde que estão na linha de frente da luta contra o coronavírus. Que demonstração de reconhecimento social. O Brasil tem jeito!”, escreveu Juliano Medeiros nas redes sociais.
O movimento ganhou o apoio de artistas, como a cantora Preta Gil. “Aplausos para os profissionais de saúde que estão bravamente cuidando de nós. Salva de palmas #profissionaisdasaude”, escreveu a cantora nas redes sociais.
O movimento começou na Itália, país com maior número de vítimas na Europa. Na tarde de sábado, 14, eclodiu uma salva de palmas em todo o país para os médicos que estão na linha de frente da batalha contra a epidemia. Os italianos continuam numa espécie de prisão domiciliar com as restrições extraordinárias decretadas para evitar o contágio. A ação também se repetiu nas janelas da Espanha e de Portugal, também motivada pelas redes sociais.
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