“A Agência Nacional de Mineração (ANM),é o segundo órgão federal mais exposto à fraude e à corrupção no país.”
Nathalia Passarinho – da BBC News Brasil em Londres – Editado p/Cimberley Cáspio
A conclusão é de uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), concluída no final do ano passado. Para a pesquisa, auditores do TCU analisaram a existência de mecanismos internos de prevenção e combate a irregularidades em quase 300 órgãos federais.
Foram verificados, por exemplo, os modelos de nomeação para diretorias, transparência de dados, existência ou não de mecanismos para evitar conflitos de interesses e capacidade de fazer auditorias internas.
O resultado foi uma espécie de ranking dos órgãos mais propensos a serem cooptados por interesses, levando em conta, também, os poderes econômicos e de regulação de cada um deles.
A Agência Nacional de Mineração (ANM), pelo seu alto poder de regulação e os poucos mecanismos de combate a irregularidades que possui, só aparece atrás da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) em risco de se envolver em fraudes e corrupção.
A BBC News Brasil encaminhou e-mail na última sexta (8) pedindo entrevista ou manifestação à ANM. Na terça (12), por telefone, a assessoria disse que ainda não tinha resposta para dar.
Cabe à ANM, subordinada ao Ministério de Minas e Energia, planejar e fiscalizar todas as atividades de exploração mineral. Para isso, deve fazer auditorias próprias em barragens e analisar laudos de estabilidade apresentados pelas mineradoras, como o que atestou a segurança da barragem da Vale em Brumadinho(MG) no final do ano passado.
Mas por falta de pessoal, a ANM acaba dependendo fortemente de inspeções encomendadas e pagas pelas próprias mineradoras.

Segundo o TCU, a Agência Nacional de Mineração, responsável por garantir a segurança das barragens do Brasil, não tem mecanismos de controle para evitar conflitos de interesse, nepotismo, fraudes e corrupção /
REUTERS/WASHINGTON ALVES
Um dos pontos considerados essenciais pelo TCU para evitar corrupção sistêmica num determinado órgão é a existência de controles internos contra irregularidades. Como mencionado antes, quanto maior o poder de regulação de uma instituição, mais mecanismos eficazes de controle ela deve adotar.
Os auditores verificaram, no entanto, que a ANM não possui estrutura adequada para detectar desvios cometidos por servidores e colaboradores. “Os critérios de avaliação de riscos institucionais e de fraude e corrupção não estão definidos, e não há controles proativos de detecção de transações incomuns”, diz o relatório.
A ANM também falha, de acordo com o TCU, nos procedimentos destinados a punir eventuais irregularidades.
Não há atribuições bem definidas para a atuação dos auditores internos da agência. E eles não têm autoridade, segundo o TCU, para recomendar mudanças de procedimentos.

Tanto a barragem de Mariana (MG), que se rompeu em 2015, quanto a barragem de Brumadinho (MG), eram classificadas como de ‘baixo risco’ de rompimento nos registros da Agência Nacional de Mineração /
CHRISTOPHE SIMON/AFP
Nepotismo e conflito de interesse
Segundo o TCU, a ANM também não verifica se há nepotismo ou conflito de interesses quando contrata colaboradores, empresas e gestores.
Ou seja, na escolha de pessoas para cargos comissionados e de direção, não há, por exemplo, análise sobre vínculos atuais e anteriores com mineradoras capazes de prejudicar a isenção da fiscalização.
“Não são verificadas as vedações relacionadas a nepotismo e conflito de interesse quando do ingresso de colaboradores e gestores da organização”, diz a auditoria.

A Agência Nacional de Mineração é ligada ao Ministério de Minas e Energia. Segundo o TCU, órgão não tem funcionários suficientes para fazer fiscalização eficaz de barragens, nem controles internos para evitar corrupção e fraudes /
MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL
“Também não há obrigatoriedade de os colaboradores e gestores da organização manifestarem e registrarem situações de nepotismo ou que possam conduzir a conflito de interesses.”
O próprio mecanismo de fiscalização adotado atualmente pela ANM esbarra em conflitos de interesses. Como a agência não tem pessoal em número suficiente, nem estrutura e recursos para fazer ela própria auditorias periódicas em barragens, essa prerrogativa é transferida para as próprias mineradoras, que contratam empresas terceirizadas para fazer os laudos.
“Somos muito dependentes ainda das informações declaradas pelas empresas”, destaca o secretário de Infraestrutura Hídrica e Mineração do TCU, Uriel de Almeida Papa.

‘O estudo mostra que a ANM não tem controles dentro da própria instituição capazes de prevenir e detectar casos de fraude e corrupção. Não significa que tem corrupção, mas sim que ela se expõe mais ao risco’, afirma Renata Normando, auditora federal de controle externo do TCU /
ANTONIO LACERDA/EPA
Os primeiros depoimentos de engenheiros que vistoriaram a barragem 1, da mina Córrego do Feijão, ilustram o quadro criado por essa situação.
Segundo reportagem do G1, em depoimento à Polícia Federal, Makoto Namba, um dos engenheiros da empresa alemã TUV SUD, contratada pela Vale para verificar a segurança da barragem, disse que se sentiu “pressionado” por um funcionário da mineradora para atestar a estabilidade da estrutura.
“O Estado não tem estrutura para que os técnicos se capacitem e também não tem técnicos suficientes, então você transfere para o próprio empreendedor a sua própria fiscalização”, disse à BBC News Brasil um promotor que participa das investigações sobre rompimento de barragens em Minas Gerais e que pediu para não ser identificado.
“Você acha que uma empresa contratada pela própria mineradora vai apontar todas as possíveis irregularidades?”, questionou.
/www.bbc.com/portuguese/brasil-47211131
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